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Consenso de Washington, a visão neoliberal dos problemas latino-americanos.


Para entender nossos problemas politicos e sociais, precisamos fazer uma "Anamnese", que consiste no histórico de todos os sintomas narrados pelo paciente sobre determinado caso clínico. Neste sentido, necessitamos de uma Anamnese da nossa política, para entender nossos dramas diante do cenário político que estamos passando. Para quem não conhece política, ou não tem noção de estratégia geopolítica, tais acontecimentos são frutos do acaso ou simples malandragem de nossos políticos.


Na realidade, muitos dos nossas problemas e crises politicas são produzidas artificialmente por agentes externos, com objetivos bem definidos e com uma grande ajuda da mídia, partidos políticos sem o devido compromisso com nossa soberania.


Um dos elementos provocadores das crises em território nacional é o documento chamado "Consenso de Washington", que está em pleno vigor que ressurgiu na era temer.


Neste post, apresentar o trabalho do Excelência Sr. Embaixador Paulo Nogueira Batista, produzindo em setembro de 1994, onde nos esclarece uma parte da origem de nossos dramas políticos e de soberania.


Do que se trata?

Em novembro de 1989, reuniram-se na capital dos Estados Unidos funcionários do governo norte-americano e dos organismos financeiros internacionais ali sediados - FMI, Banco Mundial e BID - especializados em assuntos latino-americanos.


O objetivo do encontro, convocado pelo Institute for International Economics, sob o título "Latin American Adjustment: How Much Has Happened?", era proceder a uma avaliação das reformas econômicas empreendidas nos países da região. Para relatara experiência de seus países também estiveram presentes diversos economistas latino-americanos.


Às conclusões dessa reunião é que se daria, subseqüentemente, a denominação informal de "Consenso de Washington".


Embora com formato acadêmico e sem caráter deliberativo, o encontro propiciaria oportunidade para coordenar ações por parte de entidades com importante papel nessas reformas. Por isso mesmo, não obstante sua natureza informal, acabaria por se revestir de significação simbólica, maior que a de muitas reuniões oficiais no âmbito dos foros multilaterais regionais.


Nessa avaliação, a primeira feita em conjunto por funcionários das diversas entidades norte-americanas ou internacionais envolvidos com a América Latina, registrou-se amplo consenso sobre a excelência das reformas iniciadas ou realizadas na região, exceção feita, até aquele momento, ao Brasil e Peru.


Ratificou-se, portanto, a proposta neoliberal que o governo norte-americano vinha insistentemente recomendando, por meio das referidas entidades, como condição para conceder cooperação financeira externa, bilateral ou multilateral.


O valor do Consenso de Washington está em que reúne, num conjunto integrado, elementos antes esparsos e oriundos de fontes diversas, às vezes diretamente do governo norteamericano, outras vezes de suas agências, do FMI ou do Banco Mundial.


O ideário neoliberal já havia sido contudo, apresentado de forma global pela entidade patrocinadora da reunião de Washington - o Institute for International Economics - numa publicação intitulada Towards Economic Growth in Latin America, de cuja elaboração participou, entre outros, Mário Henrique Simonsen.


Não se tratou, no Consenso de Washington, de formulações novas mas simplesmente de registrar, com aprovação, o grau de efetivação das políticas já recomendadas, em diferentes momentos, por diferentes agências. Um consenso que se estendeu, naturalmente, à conveniência de se prosseguir, sem esmorecimento, no caminho aberto.


O pano de fundo

A mensagem neoliberal que o Consenso de Washington registraria vinha sendo transmitida, vigorosamente, a partir do começo da Administração Reagan nos Estados Unidos, com muita competência e fartos recursos, humanos e financeiros, por meio de agências internacionais e do governo norte-americano.


Acabaria cabalmente absolvida por substancial parcela das elites políticas, empresariais e intelectuais da região, como sinônimo de modernidade, passando seu receituário a fazer parte do discurso e da ação dessas elites, como se de sua iniciativa e de seu interesse fosse. Exemplo desse processo de cooptação intelectual é o documento publicado em agosto de 1990 pela Fiesp, sob o título "Livre para crescer - Proposta para um Brasil moderno", hoje na sua 5ª edição, no qual a entidade sugere a adoção de agenda de reformas virtualmente idêntica à consolidada em Washington.


A proposta da Fiesp inclui, entretanto, algo que o Consenso de Washington não explicita mas que está claro em documento do Banco Mundial de 1989, intitulado "Trade Policy in Brazil: the Case for Reform". Aí se recomendava que a inserção internacional de nosso país fosse feita pela revalorização da agricultura de exportação. Vale dizer, o órgão máximo da indústria paulista endossa, sem ressalvas, uma sugestão de volta ao passado, de inversão do processo nacional de industrialização, como se a vocação do Brasil, às vésperas do século XXI, pudesse voltar a ser a de exportador de produtos primários, como o foi até 1950. Uma área em que os preços são cadentes - são hoje, em termos reais, 40% em média inferiores aos de 1970 - em virtude do notável volume de subsídios concedidos a seus produtores agrícolas pelos países desenvolvidos, da ordem de US$ 150 bilhões de dólares por ano, e da revolução no setor de materiais que vem reduzindo substancialmente o uso de matérias-primas naturais por unidade de produto obtido.


As reformas comerciais liberalizantes recomendadas pelo Banco Mundial e avalizadas pela Fiesp seriam, de resto, fielmente encampadas pelo governo Collor até mesmo no que se refere à postura a se assumir na Rodada Uruguai, de alinhamento às posições norte-americanas na questão agrícola e nos novos temas normativos de serviços e propriedade intelectual. Tudo se passaria, portanto, como se as classes dirigentes latino-americanas se houvessem dado conta, espontaneamente, de que a gravíssima crise econômica que enfrentavam não tinha raízes externas - a alta dos preços do petróleo, a alta das taxas internacionais de juros, a deterioração dos termos de intercâmbio - e se devia apenas a fatores internos, às equivocadas políticas nacionalistas que adotavam e às formas autoritárias de governo que praticavam.


Assim, a solução residiria em reformas neoliberais apresentadas como propostas modernizadoras, contra o anacronismo de nossas estruturas econômicas e políticas.


Contribuiria para a pronta aceitação do diagnóstico e da proposta neoliberal - dessa visão economicista dos problemas latino-americanos - a existência de um grande número de economistas e cientistas políticos formados em universidades norte-americanas, de Chicago e Harvard, onde passara a pontificar uma visão clássica e monetarista dos problemas econômicos.


Alguns desses economistas seriam chamados a ocupar posições de comando em seus países de origem, do que são exemplos Salinas de Gortari no México e Domingo Cavallo na Argentina. Também contribui para a ressurreição das velhas idéias liberais a ação promocional de fundações estrangeiras e de organismos internacionais, muito ativos no financiamento e organização de publicações e seminários que monopolizariam o debate acadêmico no continente e que acabariam por influir fortemente na orientação das atividades extracurriculares das universidades latino-americanas, afogadas, junto com o Estado, em dificuldades financeiras. Fator decisivo terão sido as vantagens imediatas que setores empresariais esperariam retirar das sugestões específicas da proposta neoliberal na área da reforma tributária.


A imprensa, por meio de editoriais ou de articulistas entusiastas do novo velho credo, alguns de passado esquerdista, colocaria na defensiva todos os que não se dispusessem a aderir à autodenominada "modernização pelo mercado", qualificando-os automaticamente como retrógrados ou "dinossauros". Mas essa mesma imprensa registraria, com respeito e sem quaisquer reparos, declarações do presidente da General Motors Mundial quando veio ao Brasil defender a necessidade de se conter o ímpeto da abertura comercial, com o natural receio de não poder a GM norte-americana competir no mercado brasileiro com os veículos de origem japonesa ou coreana, caso aquele processo prosseguisse. Caberia, assim, aos investidores americanos e europeus, e não aos empresários nacionais, assumir a defesa da indústria instalada no país através da política de substituição de importações condenada pela onda neoliberal.


A cartilha neoliberal já era adotada como pré-requisito para a concessão de novos empréstimos, por parte de instituições como o FMI e o Banco Mundial.A princípio, as conclusões do Consenso possuíam caráter acadêmico, mas acabaram virando um receituário imposto para a concessão de créditos. Segundo John Willianson, o objetivo das regras universais do encontro era a aceleração do desenvolvimento sem piorar a distribuição de renda.


As recomendações propostas no Consenso de Washington pautavam-se nas ideias de abertura econômica e comercial, aplicação da economia de mercado e controle fiscal macroeconômico.


Resumo: O Consenso de Washington

O Consenso de Washington documenta o escancaramento das economias latinoamericanas, mediante processo em que acabou se usando muito mais a persuasão do que a pressão econômica direta, embora esta constituísse todo o tempo o pano de fundo do competentíssimo trabalho de convencimento. Certamente, uma versão mais sofisticada e sutil das antigas políticas colonialistas de open-door nas quais se apelava, sem maiores constrangimentos, à força das canhoneiras para "abrir os portos de países amigos". Por serem menos ostensivas, as pressões atuais são mais difíceis de combater.


O Consenso de Washington, além de contraditório com as práticas dos Estados Unidos e dos países desenvolvidos em geral, contém, como pudemos apreciar, várias incoerências nos seus próprios termos. Revela-se em especial inadequado quando se tem em conta que sua avaliação e prescrições se aplicam de maneira uniforme a todos os países da região, independentemente das diferenças de tamanho, de estágio de desenvolvimento ou dos problemas que estejam concretamente enfrentando.


O diagnóstico e a terapêutica são virtualmente idênticos tanto para um imenso Brasil já substancialmente industrializado quanto para um pequeno Uruguai ou Bolívia ainda na fase pré-industrial. Não diferem muito por incrível que pareça, do que o FMI e o Banco Mundial estão recomendando à Europa oriental na sua transição para economias de mercado.


Os resultados do neoliberalismo na América Latina, apesar dos esforços dos meios de comunicação em só mostrar os aspectos considerados positivos, não podem deixar de ser vistos como modestos, limitados que estão à estabilização monetária e ao equilíbrio fiscal. Miséria crescente, altas taxas de desemprego, tensão social e graves problemas que deixam perplexa a burocracia internacional baseada em Washington e angustiados seus seguidores latinoamericanos.


De fato, como explicar que o México e a Argentina, para não citar outros que se alinharam ao modelo neoliberal, estejam sofrendo tensões de balanço de pagamentos, tão fortes que os fazem correr o risco de um colapso cambial e de suas políticas de estabilidade monetária? Como assegurar, num mercado internacional de taxas de juros em alta, por conveniências da economia norte-americana, o financiamento de déficits cavalares (sem qualquer duplo sentido), equivalentes a vários pontos percentuais dos respectivos PIBs, mais de 6% no caso argentino e mais de 8% no caso mexicano?


Como explicar, realmente, que o "Terceiro Mundo" que está dando certo seja aquele que não seguiu as prescrições neoliberais do FMI e do Banco Mundial? Talvez os tecnocratas de Washington não ficassem tão desagradavelmente surpreendidos se fossem mais humildes na sua atitude, como sugere Keynes que devam se comportar os economistas, e levassem em conta a complexidade e as especificidades latino-americanas.


Fica-se, de tudo isso, com a impressão amarga de que a América Latina possa haver se convertido, com a anuência das suas elites, em um laboratório onde a burocracia internacional baseada em Washington - integrada por economistas descompromissados com a realidade política, econômica e social da região - busca pôr em prática, em nome de uma pretensa modernidade, teorias e doutrinas temerárias para as quais não há eco nos próprios países desenvolvidos onde alegadamente procura inspiração.


As dez regras do Consenso de Washington

  1. Disciplina fiscal – o Estado deve limitar os gastos à arrecadação, eliminando o déficit público;

  2. Redução dos gastos públicos;

  3. Reforma fiscal e tributária, na qual o governo deveria reformular seus sistemas de arrecadação de impostos e ampliar a base sobre a qual incide a carga tributária, com maior peso nos impostos indiretos;

  4. Abertura comercial e econômica dos países, a fim de reduzir o protecionismo e proporcionar um maior investimento estrangeiro;

  5. Taxa de câmbio de mercado competitivo;

  6. Liberalização do comércio exterior;

  7. Investimento estrangeiro direto, eliminando as restrições;

  8. Privatização, com a venda das estatais;

  9. Desregulamentação, com o afrouxamento das leis de controle do processo econômico e das relações trabalhistas;

  10. Direito à propriedade intelectual.

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Referências bibliográficas

-Consenso de Washington: A visão neoliberal dos problemas latino-americanos, Paulo Nogueira Batista 1994.


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