31/03 Não há o que comemorar, não houve vencedores, somente Sobreviventes.

31 de Março 1964 entrou para a nossa história como início da Golpe de 64, Ditadura Militar, Regime Militar ou Revolução Militar, como é chamado ou lembrado é apenas uma triste questão de semântica, pois o mais relevante deste período foi a ruptura do processo democrático, onde nós brasileiro fomos impedidos de celebrar e usufruir de um direito inalienável de toda sociedade moderna: a participação de todos na festa da democracia e do direito todos de decidir o nosso destino e os rumos da nação, valor esse que caracterizamos como Estado de Direito.
Nesta história dantesca, o povo brasileiro ficou aproximadamente 28 anos sem escolher seus representantes legais para o legislativo e para o executivo, bem como todos os direitos civis e a liberdade de ir e vir foram suspensos, denotando uma grave violação ao direito mais básico de um Estado Moderno.
O dia 31/03 não é dia de comemoração nem tão pouco celebração, é um dia de luto, de reflexão pois foi a partir deste dia que muitas famílias conheceram a dor, a violência, a covardia, a maldade, o ódio, a indiferença, a injustiça e a omissão.
É um dia que não devemos esquecer, devemos refletir sobre o que o Estado fez com nossas famílias, com seu povo, com o pai de família, com o juiz, com estudante, com sacerdote, com os militares, com nossos indígenas, com nossos professores, nossos radialistas, com nossos deputados, com nossos jornalistas e com as nossas crianças.
É um dia que temos que ter vergonha, pois o Estado foi capaz de ser algoz de seu próprio povo com requintes de crueldade e ganância, período de 28 anos de “escuridão com a destruição das vias democráticas, e o vilipêndio da Constituição e da Liberdade em nome do Estado autocrático e destrutivo da nação brasileira”.
Período assombroso da nossa história que não deve ser esquecido ou tão pouco negado por diversos fatores pois os números são assustadores e o inventário digno de revolta, dor, reflexão e dor.
INVENTÁRIO DA VIOLÊNCIA PRATICADA DURANTE A DITADURA CÍVICO-MILITAR-EMPRESARIAL
500.000 cidadãos investigados pelos órgãos de segurança
200.000 detidos por suspeita de subversão
50.000 presos entre março e agosto de 1964
11.000 acusados em julgamentos viciados de auditorias militares
5.000 condenados
10.000 torturados no DOI-CODI de São Paulo
40 crianças presas e torturadas no DOI-CODI paulistano
8.300 vítimas indígenas de dezenas de etnias e nações
1.196 vítimas entre os camponeses
6.000 mil apelações ao STM que manteve as condenações destes 2.000 casos
10.000 brasileiros exilados
4.882 mandatos cassados
1.148 funcionários públicos aposentados ou demitidos
1.312 militares reformados compulsoriamente
1.202 sindicatos sob intervenção do Estado e do Judiciário cúmplice e
inconstitucional
248 estudantes expulsos de universidades pelo famigerado decreto
ditatorial numero 477
128 brasileiros e 2 estrangeiros banidos sendo alguns sacerdotes
Católicos.
4 condenados à morte (pena comutada para prisão perpetua)
707 processos políticos instaurados pela Justiça militar em diversas Auditorias
49 juízes expurgados, três deles do Supremo Tribunal Federal
3 vezes em que o Congresso Nacional foi fechado pelos generais ditadores
7 Assembleias Legislativas postas em recesso
Censura prévia a toda a imprensa brasileira
434 mortos pela repressão
144 desaparecidos
126 militares, policiais e civis mortos em ações contra a resistência à ditadura.
100 empreiteiras e bancos envolvidos em escândalos abafados pelos militares
Reimplantação do trabalho escravo nas fazendas do Brasil com o beneplácito dos governos militares.
Sucateamento das Universidades pela imposição do programa MEC-USAID
Destruição do movimento social brasileiro
Fim das organizações da sociedade civil como UNE, Centros de Cultura,
Ligas Camponesas, JUC, Agrupamentos e partidos de esquerda.
Corrupção em todos os níveis por grupos militares e cobrança de propinas para as grandes obras.
Submissão aos interesses norte-americanos pela presença da CIA e de torturadores treinados na Escola das Américas em todos os órgãos policiais e militares.
Destruição das Guardas municipais e estaduais e militarização das policias
Domínio da Lei de Segurança Nacional e propaganda da Ideologia de Segurança Nacional.
Expansão do poder de empresas beneficiarias do golpe como redes de TV, jornais pró-ditadura e grupos econômicos que financiaram a tortura e a repressão.
Construção de obras faraônicos como Transamazônica, Ponte Rio-Niteroi, Itaipu e outras com desvio de vultosas quantias do erário publico para empresas e corruptos do governo federal e estadual.
Instauração de senadores e prefeitos biônicos.
Criação de locais de tortura e casas da morte, como por exemplo, a de Petrópolis-RJ.
Instalação de campos de concentração em território nacional usando de técnicas nazistas.
Pagamento e manutenção de imensa rede de arapongas e informantes das forças repressivas para denunciar os que lutavam pela democracia.
Apoio de médicos para a realização da tortura e para fazer laudos falsos das mortes em prisões e locais do Estado brasileiro.
Perseguição e morte de brasileiros fora do Brasil em ligação com as forças ditatoriais de outros países do Cone Sul.
Acolhida de ditadores de outros países como Alfredo Stroessner do Paraguai.
Financiamento de grupos paramilitares.
Apoio a atos terroristas e incêndio de prédios (UNE), bancas de jornais, redações, igrejas, sindicatos, e apoio às milícias de latifundiários para extermínio sistemático e impune de índios e posseiros em toda a Amazônia e Nordeste brasileiro.
Campanha de difamação contra bispos, pastores, líderes políticos em canais de televisão para indispor a opinião pública e favorecer a repressão.
Proibição de citar o nome de Dom Helder Câmara em qualquer órgão de imprensa do Brasil por mais de 20 anos, quer notas positivas quer negativas.
Bombas explodidas em todo o território nacional e em particular no episódio do Rio Centro a mando de generais e grupos terroristas dentro das Forças Armadas.
Perseguição aos artistas brasileiros.
Formação da ARENA, partido de direita manipulado pelos militares e elite financeira do Brasil.
Repressão e perseguição da UNE e invasão da PUC-SP pelo coronel Erasmo Dias.
Concluímos que foi um período triste na história do Brasil, que não houve vencedores somente derrotados, muito menos heróis, porém, houve sobreviventes com muita dor e mágoa, precisamos evoluir como povo e nação para que essa triste história nunca mais se repita
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Livro: Brasil: Nunca Mais - Dom Paulo Evaristo Arns