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A Felicidade: Perspectivas de Aristóteles, dos Estoicos e nos Dias de Hoje

Na época em que eu era aluno da Universidade Federal do Paraná, entrei em uma crise existencial muito grande. Acreditava que era depressão, mas na realidade era uma crise de valores, na qual eles estavam sendo corroídos pelas minhas leituras e reflexões. Tudo estava perdendo sentido, nada tinha conexão e o ceticismo estava consumindo minhas forças.


Neste sentido, minha esperança e meus sonhos estavam se diluindo ao longo do curso de Filosofia. Era um tempo difícil, pois a vida não tinha sabor, estava tudo cinza, nebuloso, e muitos valores não faziam sentido.


Mas continuei em minha busca pelo sentido nas coisas, e foi nesta busca que resolvi fazer uma releitura da obra "Ética a Nicômaco" de Aristóteles. Foi difícil fazer um reset existencial, pois tive a necessidade de reconstruir uma série de conceitos e valores que haviam sido destruídos pelas minhas leituras filosóficas. Então, comecei pela obra fantástica de Aristóteles, pois ela tinha uma orientação para alguém como eu que precisava fazer esse reset, precisava buscar a felicidade, pois, até aquele momento, ela era efêmera e não se sustentava.


Minha busca pela felicidade era uma preocupação central, que também era da filosofia, e foquei minhas leituras pelas perspectivas do aristotelismo e do estoicismo.

Assim, seguem algumas lições que tomei como aprendizado: Para Aristóteles, a felicidade, ou eudaimonia, é o objetivo final da vida humana. Ele a define como a realização plena das potencialidades humanas, alcançada através da prática da virtude e do cultivo do caráter. Segundo Aristóteles, a felicidade não é simplesmente um estado emocional passageiro, mas sim um estado de realização e plenitude que resulta da busca contínua pela excelência moral e intelectual. Para alcançar a felicidade, devemos viver de acordo com a razão e cultivar as virtudes éticas, como coragem, justiça e generosidade. Ao agir virtuosamente e buscar o bem comum, alcançamos a eudaimonia e realizamos nosso potencial como seres humanos.


Os estoicos, por outro lado, oferecem uma visão diferente da felicidade, baseada na aceitação serena da vida e na indiferença em relação às circunstâncias externas. Para os estoicos, a felicidade não está em buscar prazeres ou evitar dores, mas sim em cultivar a sabedoria e a virtude interior. Eles acreditam que a felicidade verdadeira vem de viver de acordo com a natureza racional do universo e aceitar com equanimidade tudo o que acontece, seja bom ou ruim. Em vez de se preocuparem com coisas que não podem controlar, os estoicos concentram sua atenção naquilo que está sob seu controle - seus pensamentos, desejos e ações. Ao cultivar a virtude, viver de acordo com a razão e aceitar com serenidade os eventos da vida, os estoicos encontram uma fonte duradoura de felicidade interior.


Hoje, em uma sociedade marcada pelo consumo e pela busca constante por prazeres imediatos, a compreensão da felicidade muitas vezes se desvia das visões filosóficas antigas. Muitas vezes associamos a felicidade a conquistas materiais, sucesso profissional, status social ou gratificação instantânea. No entanto, essa busca incessante por satisfação externa muitas vezes nos deixa vazios e insatisfeitos, pois nos afastamos de valores mais profundos e significativos.


Nesse contexto, as lições de Aristóteles e dos estoicos sobre a importância da virtude, da razão e do cultivo do caráter podem oferecer orientação valiosa. Eles nos lembram que a verdadeira felicidade não é encontrada em circunstâncias externas, mas sim dentro de nós mesmos. Ao cultivar a excelência moral, viver de acordo com a razão e aceitar serenamente os eventos da vida, podemos encontrar uma fonte mais duradoura de felicidade interior, que transcende as flutuações do mundo externo.


No entanto, é importante reconhecer que alcançar essa felicidade interior pode ser particularmente desafiador na era da modernidade líquida de Bauman, caracterizada pela incerteza, pela mudança rápida e pela falta de estruturas sólidas e duradouras.


Em um mundo onde as relações humanas são cada vez mais fluidas e transitórias, encontrar um sentido de estabilidade e segurança emocional pode ser uma tarefa árdua. No entanto, mesmo diante desses desafios, as lições de Aristóteles e dos estoicos sobre a importância da virtude e da aceitação serena continuam a oferecer orientação e inspiração para aqueles que buscam uma vida mais plena e significativa.


A felicidade, conforme refletido nas filosofias de Aristóteles e dos estoicos, é mais do que um estado emocional passageiro ou a busca por prazeres momentâneos. Em vez disso, é um estado de realização e plenitude que vem da busca contínua pela excelência moral, do cultivo do caráter e da aceitação serena da vida. Para Aristóteles, a felicidade está na realização plena das potencialidades humanas através da prática da virtude e do viver de acordo com a razão. Para os estoicos, a felicidade verdadeira é encontrada na sabedoria, na aceitação das circunstâncias e no cultivo da virtude interior, independente das condições externas.


Assim, a felicidade pode ser vista como um estado de harmonia interior, onde encontramos significado e propósito em nossas vidas, vivendo de acordo com nossos valores mais profundos e transcendentais. É uma busca constante pela excelência moral e pela realização de nosso potencial como seres humanos, mesmo em face das adversidades e incertezas da vida. Portanto, a felicidade reside dentro de nós mesmos e é alcançada através do cultivo da virtude, da razão e da aceitação serena dos eventos da vida.



Prof. Daniel Mota

 

ARISTOTELES. Ética a Nicômaco; Tradução, textos adicionais e notas Edson Bini. 4. ed. São Paulo: Edipro, 2014.

 

SÊNECA. Sobre a brevidade da vida / Sobre a firmeza do sábio. Tradução e notas de José Eduardo S. Lohner. São Paulo: Penguin Classics; Companhia das Letras, 2017.

 

MARCO AURÉLIO. Meditações. Introdução, tradução e notas de Jaime Bruna. São Paulo: Cultrix, 1989.

 

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.


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Prof. Daniel Mota possui graduação em Filosofia pela Universidade Federal do Paraná (1996), especialização em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR) Campus Curitiba e é pós-graduando na UNESPAR - Universidade Estadual do Paraná, Campus de Apucarana FECEA-PR. Com 30 anos de experiência na área da educação, trabalhou por 25 anos no mercado financeiro e é funcionário da rede pública de ensino do Estado do Paraná. Além disso, é proprietário e editor do site Os Argonautas Mídia Alternativa e fundador e proprietário do projeto pela democratização da leitura, Sebo Apucarana.

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